sexta-feira, 30 de novembro de 2012

As favoritas da editora de fotografia - Parte I

Durante meses, a Ágata Xavier andou metida em arquivos. Hemeroteca, Torre do Tombo, Arquivo Municipal, Gabinete de Estudos Olisiponeneses... Onde quer que suspeitasse existirem fotos que podiam interessar-nos, lá estava ela, a tocar à porta, a fazer telefonemas, a mandar emails. Tão obsessiva como tenaz - duas características que muito lhe agradecemos - não descansou enquanto não viu tudo - para depois poder escolher.

Apesar de parte das imagens que se vêem no livro terem sido cedidas por particulares e algumas instituições, sem o trabalho da Ágata nunca teria sido possível apresentarmos em Lx60 a diversidade visual que tanto o enriquece. A partir de dada altura, passámos a olhar para ela não como pesquisadora ou editora, mas como alquimista, detentora única da fórmula para transformar um orçamento curtíssimo num tesouro para todos nós.

E como as fotografias são como os filhos - todos iguais mas uns mais iguais do que outros - aqui fica a primeira parte das escolhas da editora, num texto escrito pela própria.


Escolher imagens entre imagens que já foram escolhidas é duplamente difícil. Todas elas contam histórias do seu tempo que, por sua vez,  se entrecruzam com o meu. Muitas vezes tinha o tema ou o texto para me guiar, noutras escolhia fotografias que via sem qualquer referência, apenas pela sua beleza e importância, na esperança que a Joana escrevesse sobre elas.

Agora, neste exercício de escolha, usei o factor ligação em vez dos critérios de gosto ou beleza.  São três fotografias cuja descoberta me deu alegria.

p. 42 e 43 - Adeus, até ao meu Regresso



Sou filha e neta de retornados. A guerra colonial diz-me muito.  Convivi durante anos com histórias de Moçambique e da Índia. De como antes a vida era melhor. Mas só para alguns. Esta fotografia mostra os primeiros soldados que partem para a guerra, em 1961. Mas há algo mais. O que me  entristece mais quando olho para ela, mais do que não saber se aqueles rapazes voltaram ou não, é a sua felicidade aparente por terem o que comer. Para muitos, a guerra era encarada como uma garantia de ter três refeições diárias. Os olhares de dois deles em direcção à comida e um outro que sorve a bebida como se esta não pudesse esperar são arrebatadores e, ao mesmo tempo, tristes. 

p. 46- 20 Valores


Procurar imagens de época é como procurar uma agulha num palheiro. A agulha está lá mas encontrá-la é um processo demorado, lento e exige paciência. Até aí estava preparada mas não estava para o que aconteceu com esta imagem, encontrada numa pasta sobre moda nos anos 60.
Que o cabelo da Maria João Pires se assemelhasse aos cortes arrojados de Paris e Londres, um estilo garçonette ainda escandaloso num Portugal  de mulheres cabeludas, e a fizesse contar deste lote até seria uma hipótese se não fosse completamente descabida. Esta fotografia, uma das mais antigas da pianista a ser publicada, fez-me dar um salto na cadeira: pela surpresa, pelo inesperado, pela imprevisibilidade  de a encontrar quando já achava que tal era impossível.

p. 169 – Ordem para Assaltar, Revistar, Vandalizar


A fotografia não engana, é uma foto-passe igual às que tiramos nos photomatons das estações de metro ou nos fotógrafos de centros comerciais. Incomodei o Luandino Vieira várias vezes com emails a pedir imagens suas da década de 60. O assistente editorial da D. Quixote fê-lo outras tantas. Ele enviou umas recentes que não serviam o propósito do livro. Voltei a insistir e Luandino lá respondeu, de maneira muito educada, mais do que a minha ignorância merecia, que tinha estado preso entre 61 e 72 mas que deveria ter uma fotografia tirada poucos dias antes de ir para a cadeia. Felizmente encontrou a imagem. Foi tirada para a um livro que escreveu, provavelmente a primeira edição do Luuanda,  distinguido pela  Sociedade Portuguesa de Escritores. 

Biografia

Chamo-me Ágata e moro em Lisboa com duas gatas e um bípede.

Sou licenciada em História de Arte - o mesmo é dizer que passei quatro anos numa sala às escuras cheia de gente vestida a ver gente despida projectada na parede. 

Durante três anos fui coordenadora da secção de fotografia de um jornal que não voa com o vento, o i. Actualmente, continuo a colaborar com o jornal tanto em texto como em imagem. Para além, disso escrevo textos comerciais para uma empresa americana e faço pesquisa e edição de fotografia para livros.


Portfólio
http://cargocollective.com/agataxavier



quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Seis graus de separação

Mais um pormenor que não conseguimos incluir no livro, desta vez uma brincadeira do talentoso Luís Leal Miranda, autor de boa parte dos textos sobre ié-ié do livro. A ideia era encontrar uma forma diferente de contar uma história conhecida: o encontro de Paul McCartney com a banda portuguesa Jota Herre num hotel do Algarve e a canção que o músico dos The Beatles lhes ofereceu, "Penina". Com o humor que muitos lhe invejam, o Luís ainda conseguiu ligar o ié-ié português a outros ícones do rock'n'roll. Pequenino este mundo do rock dos 60s.

Seis graus de separação
Como o Ié-Ié foi dos Beatles aos Rolling Stones.

Beatles -> Paul McCartney -> Jota Herre -> Carlos Mendes -> Sheiks -> Rolling Stones

Enquanto revolucionavam a música pop, os Beatles eram também uma das bandas mais populares dos anos 60 -- revolucionando a ideia de estrela pop. Pelo meio, tiravam umas férias e o Algarve era um dos destinos preferidos de pelo menos um deles.

Paul McCartney ficou hospedado no Hotel Penina no Verão de 1968. E foi no bar desse hotel de luxo que decidiu subir ao palco e tocar com a banda residente. Perto do final da actuação, McCartney improvisou uma canção a que chamou de “Penina” e ofereceu à banda do hotel, os Jota Herre.

Foi um toque de midas na carreira modesta dos Jota Herre que gravaram um EP com a canção de McCartney e gozaram como puderam o breve sucesso que lhes coube em sorte. A música viria a ser incluída numa compilação, “Songs That The Bealtes Gave Away”, mas não tocada pelos Jota Herre.

Carlos Mendes gravou a versão de “Penina” que é hoje conhecida pelos beatlemaníacos de todo o mundo. Mas antes de o fazer teve de pôr fim à sua banda de sempre, os Sheiks, curiosamente apelidados de “Beatles portugueses”.

Os Sheiks, formados por Mendes, Paulo de Carvalho, Fernando Caby e Jorge Barreto, tiveram grande sucesso em Portugal e até no estrangeiro. Depois de uma digressão por Brasil e França, foram convidados para fazer as primeiras partes de uma banda de renome mundial. Recusaram, porque o pai de um dos músicos não autorizou o processo de saída do país. A banda que os convidou chamava-se Rolling Stones.

A outra banda sensação dos anos 60, os Rolling Stones fizeram o que puderam para ser tão grandes como os Beatles, revolucionando a maneira como se comparam bandas até hoje.






Luís Leal Miranda não nasceu em Lisboa, nem nos anos 60, mas mudou-se para a capital há 11 anos e já jantou no bar Anos 60. Tem 29 anos, foi jornalista do Sol e do i, mas agora é criativo na Ivity. Em casa estão duas guitarras a ganhar pó. É uma pena.

Para perceber o que ele anda a fazer para não dar uso às guitarras - duas - é clicar nos links aqui em baixo:






E ainda temos este bichano. Parece que é um concurso. Aqui.





Almanach Silva

Mês a mês, o trabalho que o Jorge Silva tem vindo a desenvolver no Almanach Silva - histórias da ilustração portuguesa vai-se tornando cada vez mais obrigatório. Das ilustrações aos textos, passando pelo pormenor e cuidado com que cada elemento é tratado, tudo é exemplar neste blogue - incluindo as entradas sobre os nossos queridos anos 60. Esperamos apenas que ele não perca a paciência e que um dia vejamos todos estes tesouros reunidos num bonito volume em papel, à antiga.

Ora espreitem - e só a título de aperitivo:

"João Abel Manta(Lisboa, 1928) chega ao Almanaque em dezembro de 1960. E acabam logo ali os cartoons avulsos que eram tique sediço de outros Almanachs. E começa gloriosa cavalgada ilustrando o cadáver, já putrefacto nos anos sessenta, do Estado Novo, o malfadado Reino dos Pachecos, maquinação em código deste Almanaque. Foi a paródia aos epicenos (definição: nomes dos animais que designam indiferentemente o macho ou a fémea) inventariando as fases de vida de um típico casal com o seu cortejo de ilusões e secretas infidelidades. Foi a passerelle de uniformes urbanos de variegada fauna, os artistas reumáticos da Sociedade Nacional de Belas Artes, os intelectuais caixa de óculos que queriam salvar o mundo à mesa do café, os marialvas, toureiros e pintas de toda a pinta, que escondiam as mulheres em casa para se babarem de gozo na rua. Foram as mazelas escondidas da Lisboa capital, a precisar de novo terramoto. Foi, enfim, o retrato crudelíssimo de uma sociedade de tristes à espera de um longínquo Abril.", in Almanach Silva, http://almanaquesilva.wordpress.com/




Quem Não Quer Ser Homem Não Lhe Veste a Pele, Almanaque, dezembro 1960-janeiro 1961
Imagens retiradas do blogue Almanach Silva. A visitar.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Tem lume?

Esta semana, o nosso Rui Miguel Tovar, autor de grande parte dos textos sobre desporto do Lx60, incluindo a entrevista com o Pantera Negra e a escolha do "11 ideal da melhor equipa portuguesa de sempre", apresentou o seu último livro, o Almanaque do Benfica. O que nos trouxe aqui:


Por sua vez, estes cigarros Benfica levaram-nos a outras marcas desaparecidas, que fomos encontrando aqui e ali, numa época em que fumar era até considerado bom para a saúde - desde que fosse a marca certa, claro.




No livro, como sabe quem já leu, optámos por contar a história de António Garcia, o designer que concebeu as embalagens dos SG, entre várias outras marcas, também elas desaparecidas. O resultado foi, esperamos, uma homenagem a uma das pessoas que marcou o quotidiano visual dos anos 60. O trabalho gráfico, exemplar, é do Pedro Fernandes, o braço-direito do Nick Mrozowski nesta aventura.


quinta-feira, 22 de novembro de 2012

E agora na Tentações da revista Sábado

Duas semanas antes de chegarmos às livrarias, a revista Sábado pré-publicou algumas histórias do Lx60. Agora é a vez da crítica na Tentações, que sai com a mesma revista. E se o Prof. Marcelo se tornou famoso pelas notas de 0 a 20 valores, aqui vêmo-nos avaliados numa escala ainda mais precisa: 85%!


Horácio Novais, o homem por trás desta foto

Uma das melhores coisas de fazer este livro foram as surpresas. Histórias, personagens, objectos, tantas coisas tão boas já esquecidas ou apenas escondidas. A foto com que arrancamos para Lx60 foi uma dessas surpresas. Bem como o homem que a tirou, o fotógrafo Horácio Novais - "Novaes", na origem.

Estação do Saldanha. Próxima paragem: Lx60!

Ambiente na Estação do Saldanha. Não entrou mas esteve na nossa lista

*Os Novais eram uma família de fotógrafos. Horácio (1910-1988) era filho de um - Júlio (1867-1925) - e sobrinho de outros dois - António (1855-1940) e Eduardo (1957-1951). O irmão, Mário (1899-1967), também seguira a tradição familiar. Horácio começou aliás por trabalhar com ele e também no jornal O Século, como fotojornalista e ainda responsável pelo trabalho de laboratório.

O Estúdio Horácio Novais abre portas em 1931. Ao longo de 50 anos, cristaliza a vida de Lisboa, da arquitectura às peixeiras, do comércio aos bairros populares. O fotógrafo participa em concursos - em Junho de 1947, ganha o primeiro prémio na Exposição Primavera em Flor do Instituto Superior de Agronomia com a foto Tulipas - , colabora com alguns dos melhores arquitectos da época, faz fotografia institucional, industrial, publicidade, sem nunca afastar o lado documental.

Alfama

Cais da Ribeira

O espólio de Horácio Novais compreende quase 50 mil documentos. E uma parte siginificativa está online através do Flickr no photostream da Biblioteca de Arte - Fundaçao Calouste Gulbekian. Foi lá que a Ágata Xavier mergulhou na pesquisa de imagens para Lx60 e foi lá que outras pessoas da equipa se perderam, maravilhadas com surpresas atrás de surpresas, a tentar absorver o espírito da época. 


 Praça do Areeiro

Restauradores

Foi do mesmo site que levámos emprestadas estas fotos que aqui mostramos em jeito de teaser (ou, em português, provocação). Vale a pena ir conhecer. E aproveitar para espreitar as restantes colecções, incluindo a de Mário Novais

Campanha da Nestlé com um dos famosos bebés Nestlé. Quem arrisca um percentil?

*Informação retirada do site do Centro Português de Fotografia

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Lx60 no Horas Extraordinárias

As recordações e palavras gentis da editora que mais jovens e bons talentos descobriu e lançou, a Maria do Rosário Pedreira. Sentimo-nos lisonjeados.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Lisboa pelos cabelos

É mais uma daquelas ideias que nunca chegaram a concretizar-se. Sempre pensámos fazer um capítulo dedicado à estética capilar da Lisboa nos anos 60. Fomos matutando no assunto, trocando ideias, e recolhendo material, das notícias sobre as Galas dos Penteados aos editoriais de moda vindos de Paris. No fim, os cabeleireiros acabaram reduzidos a uma nota sobre as casas mais chiques da cidade na página dedicada à alta-costura lisboeta e os anúncios que encontrámos nas revistas Século Ilustrado, Flama e  Crónica Feminina ficaram na gaveta - até agora.*








*Alguns dos anúncios foram redimensionados

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Outra vez no Jornal de Negócios!


Ainda à espera de el-rei D. Sebastião

No final do Verão de 1967, o Quarteto 1111 torna-se o primeiro conjunto português a passar no "Em Órbita", popular programa do Rádio Clube Português que divulga as últimas novidades do rock 'n roll em inglês. A canção é esta, "A Lenda de el-rei D. Sebastião". Rock progressivo e oposição subtil. 


Completaram-se há pouco 45 anos. A sonoridade pode estar datada, mas a letra mantém-se actual, muito mais do que desejaríamos.


quarta-feira, 14 de novembro de 2012

sábado, 10 de novembro de 2012

Rodados em Lx e arredores 60

O filme de James Bond Ao Serviço de Sua Majestade é o mais famoso mas não foi de longe o único a ser rodado em Portugal. Nos anos 60, Lisboa e sobretudo a Costa do Sol servem de cenário a dezenas de produções internacionais. No livro, contamos a história da primeira agência de casting e de modelos em Portugal, a Juno, que tratava de arranjar figurantes para todas estas fitas. Só não mostrámos as imagens em movimento. Num Lx60 multimédia a coisa podia ser mais ou menos assim.

"Entretanto, o clima ameno, as paisagens variadas, a mão-de-obra especializada e o baixo custo de vida, fazem de Lisboa e da Costa do Sol um destino cada vez mais frequente das produções internacionais. A primeira missão da Juno é 'A Man Could Get Killed' (1966), fita de espionagem com James Garner e Sandra Dee."*

(Era assim que imaginávamos - ou nos lembrávamos de - Lisboa e os Lisboetas?
Vale a pena procurar mais imagens do filme)

"Para o britânico 'Hammerhead' (1968), a agência ocupa durante semanas a Praia do Museu Conde Castro Guimarães, em Cascais, onde, numa das cenas, uma festa psicadélica, põe centenas de hippies a dançar. Como em Portugal hippies são coisa nunca vista, têm de vir contentores de roupa de Londres. 'A praia estava cheia, havia bodypainting. As pessoas ficaram loucas. Difícil era assegurar que os adereços não desaparecessem', explica Mizette [Nielsen, uma das fundadoras da agência]."*

(O delirante Hammerhead)

"O momento de glória da agência é 007, 'Ao Serviço de Sua Majestade' (1969). A Juno arranja 250 figurantes para cenas na Praia do Guincho e no Hotel Palácio. Muitos maridos só deixam as mulheres participar se eles também puderem entrar. 'Meia Lisboa de homens meteu férias para poder filmar', conta na altura à revista Século Ilustrado June Burton [a outra fundadora da agência]."*

(O mais fácil de rever, rodado entre Portugal e a Suíça)

E um bónus:



*Citações retiradas de Lx60.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Lx60 no Prova Oral

Terça-feira falou-se da vida em Lisboa nos anos 60 no programa Prova Oral, sim, esse mesmo, o internacionalmente famoso (a sério) - e, quem diria, bastante divertido - programa do Fernando Alvim e da Xana Alves na Antena 3. O pretexto: Lx60.

Para ouvir, é só clicar aqui.


PS: O Alvim diz que somos um dos dois melhores livros do ano. Ficámos muito orgulhosos, sobretudo depois de sabermos que o outro é este, das edições Pato Lógico. Vale a pena espreitar.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Os calhambeques, bip, bip

Nos anos 60, o mercado automóvel acelera de vez em Portugal. É difícil acreditar nos números quando os vemos: 15 817 novos ligeiros matriculados em 1960 para 54 900 em 1969. Mais do triplo. O verdadeiro boom dá-se em 1965 e até ao final da década. E os mais vendidos são estes que aqui estão, os Fiat - ao todo, quase 37 mil novinhos em folha em apenas 10 anos. Sobretudo dos mais pequenitos. Quem não se lembra de os ver deslizar por aí?


Os grandes rivais eram os "carocha" e a Volkswagen, segunda marca mais popular no país. Mas os anos 60 foram generosos em carisma, e os automóveis não foram excepção. Uma das coisas de que tivemos pena foi de não poder incluir no livro alguns dos anúncios que fomos encontrando. Aproveitamos agora o blog.


Morris, "o verdadeiro estilo da nossa época", e a oitava marca mais vendida no país.

MG, um luxo bem popular.